Por um Jornalismo Digital com a essência das startups

Por um Jornalismo Digital com a essência das startups

Ilustração: Carla Nardi

Em março, o Pew Research Center´s Project for Excellence in Journalism divulgou o The State of The News Media 2013, relatório anual sobre as perspectivas de mercado do jornalismo americano. É a pesquisa mais importante no setor, que evidencia a crise que passa o setor – sobretudo no Brasil. Os problemas apresentados, contudo, chegam a uma solução descrita brevemente no relatório: o Jornalismo Digital precisa se reinventar. Para tanto, um ingrediente nada desprezível está disponível no mercado: a essência e inteligência do universo das startups, empresas que buscam a inovação em seu segmento e operam com uma lógica de experimentação rápida, segundo a qual apenas ideias que logo se mostram promissoras recebem mais investimentos.

Evidentemente, o cerne da pesquisa envolve o crescimento de jornais americanos que aderiram ao paywall. Em 2012, 450 dos 1.380 diários impressos do país adotaram algum tipo de cobrança digital – muito em função do sucesso do modelo do The New York Times e da queda de receita de publicidade impressa: pelo sexto ano consecutivo, a renda caiu 7,3%. Para cada dólar ganho no mundo digital, há uma perda de 16 dólares no universo físico, dos papéis, segundo relatório.

Essa estratégia, aliás, foi projetada recentemente por mais um outro gigante de comunicação. Semana passada, o Washington Post confirmou o uso do paywall. Essa reprodução, contudo, não preocupa leitores. Outro importante detalhe do The State of The News Media relata que os leitores não estão preocupados com a saúde financeira de suas fontes de leitura.

Ao insinuar o uso do paywall, o The State of The News Media cita suavemente uma possível solução. “Anúncios não estão pagando as contas. É o momento de realizar experiências com modelos de conteúdo pago, uma vez que o próprio produto – a informação – se tornou commodity”, explica em um pequeno trecho – o mais importante, aliás. Aqui cabem duas análises.

A primeira é relativa ao conceito de informação que, pela primeira vez na história do relatório, ganhou a alcunha de um produto produzido em grande escala. Visitar sites de notícia é sinônimo de acompanhar os mesmos assuntos, escritos às vezes pelas mesmas pessoas. Fugir do lugar-comum é uma questão em extinção no universo digital do Jornalismo.

A segunda pode ser atribuída aos experimentos. Faltam tentativas audaciosas de apresentação e novos modelos de conteúdos informativos para criar novas receitas. O The New York Times, talvez, é uma das poucas empresas a adotar esse modelo. Usar APIs públicas, coletar dados escondidos nos porões da web e cruzá-los são algumas das ações que podem modificar a história do que é produzido no setor. Informação na internet é, sobretudo, um produto a ser oferecido ao maior interessado, o leitor.

Recentemente, a companhia produziu uma extensa – e detalhada – série de seis reportagens sobre 16 esquiadores apanhados em uma avalanche no estado de Washington, em 19 de fevereiro. Foram necessários seis meses e onze profissionais para produzir um conteúdo que, na página principal da empresa de notícia, teria poucas horas de destaque. É importante destacar: muitos outros sites de notícia já produziram conteúdos similares. Na ocasião, o The New York Times só inovou no quesito modelo de negócio – o que, aliás, foi pouco discutido: a adesão ao universo dos livros. A reportagem multimídia está à venda em quatro modelos. É a estratégia conhecida na web como e-singles.

Outra iniciativa da empresa, digna de esperança por novos tempos no setor, é o TimeSpace, programa de parceria entre startups de jornalismo e a empresa – prática muito comum em outros setores, já desenvolvida na CNN, BBC e Irish Times. Trata-se de uma espécie de incubadora de projetos, que pode levar a companhia a um novo patamar no mundo da inovação. O The New York Times percebeu que ao Jornalismo falta um combustível nada desprezível: a inteligência e velocidade das startups. É um alerta – ou recado – às empresas de Jornalismo brasileiras que, paulatinamente, tentam descobrir que companhias de Jornalismo tornaram-se, sobretudo, companhias de tecnologia.

rafael-sbarai*

 

Rafael Sbarai é jornalista, editor do site de Veja e mestre em Jornalismo Digital e Colaboração, além de professor de Jornalismo Digital do programa de pós-graduação da Fundação Armando Álvares Penteado (Faap) e pesquisador de mídia.

Twitter: @rafaelsbarai

Artigo elaborado exclusivamente para o Cobertura.

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